Voltei para varrer a poeira deste
blog-cabaré-aleatório. Sei que negligenciei o coitado por muito tempo
(mais de um ano!), portanto vou tentar atualizá-lo com a maior frequência
possível a partir de agora e assim atrair a freguesia.
Nesta "ressurreição" do blog, inaugurarei
uma seção: a de resenhas
musicais. Sempre que eu ouvir algo novo - ou sentir vontade de analisar um
álbum que já ouvi, depende do meu estado de espírito - estarei postando neste
espaço as minhas impressões acerca da obra musical escolhida. Aceito sugestões
dos leitores (Jennifer não se iluda) para futuras resenhas, a caixinha de
comentários está dando sopa aí.
Segue a resenha adaptada do clássico The Dark Side of the Moon, postada em um antigo blog meu
quando eu era uma criança juvenil criada a leite de pêra. Como devem ter
deduzido, tenho um longo histórico de abandono de blogs; se este entrar para as
estatísticas, não se surpreendam.
Sem mais firulas, vamos lá:
Resenha postada originalmente no finado blog Palavra Chave, em 03/12/10
Vou começar com uma
“pseudo-resenha” musical, já que ouvir música é o que mais tenho feito
ultimamente, mais do que já ouço normalmente. E já de cara escrevo sobre um
mega-ultra-power clássico não só do Rock ‘N’ Roll, mas também da música em
geral: Dark Side of the Moon (1973), do Pink Floyd. É difícil falar sobre algo
que gostamos muito sem cair no lugar comum; mas tentarei deixar aqui minhas
impressões sobre este álbum tão importante e tão PERFEITO! (rs)
Trata-se de um álbum conceitual
que lida, antes de tudo, com a vida. E a vida nos traz muitos aspectos, sejam
eles positivos ou negativos: a morte, o tempo, a loucura, o dinheiro... todos
eles são abordados, e com uma profundidade e uma sensibilidade tão grandes que
é impossível não se envolver pelo clima sombrio e ao mesmo tempo otimista. Fico
imaginando o impacto deste bolachão quando foi lançado, não só pelas letras,
mas principalmente pelo som em si (recursos inovadores para a época como
colagens de sons, transposição de vozes e equipamentos eletrônicos estão
presentes aqui). Além do mais, o Floyd tentava se desprender da sonoridade
psicodélica tão influenciada por Syd Barrett nos primeiros álbuns, buscando uma
identidade.
O álbum já começa de maneira
atípica, com a pequena instrumental Speak To Me: batidas ritmadas de um coração
seguidas por colagens de vários sons das músicas seguintes (risadas, caixas
registradoras); um grito desesperado de mulher dá lugar a Breathe, uma das
minhas preferidas. A cadência entre os instrumentos dá serenidade, os synths
“choram”, e logo ouve-se o vocal duplicado e harmonioso de David Gilmour.
On The Run é mais uma
instrumental, eletrônica e com um quê de psicodelia. Logo depois dela somos
apresentados a uma das músicas mais conhecidas da carreira do Floyd, Time:
relógios dão alarme simultaneamente, uma passagem calma e o famoso primeiro
verso cantado por Dave, com vocal muito diferente do começo do álbum: está
forte, provocativo, irônico, e a letra é uma das melhores já criadas por Roger
Waters. O que dizer do solo dessa música? Simplesmente de outro mundo. Não é à
toa que Gilmour é considerado um dos guitarristas que possuem mais feeling;
você consegue sentir ele pôr toda a sua alma aqui (ficou meloso, né? Abafa!). O
final é uma pequena volta ao tema instrumental de Breathe.
Após esse momento de epifania, o
saudoso Rick Wright inicia The Great Gig In The Sky com um lindo pianinho, e
uma voz ao fundo falando sobre o medo da morte. As vocalizações da convidada
Clare Torry dão o tom de desespero e morbidez de que a música precisa, criando
assim mais uma linda e obscura peça.
Caixas registradoras, a linha de
baixo inconfundível... Adivinhou, né? Dificilmente alguém não conhece o começo
de Money, de longe a mais comercial do Dark Side, o que acentua ainda mais a
ironia contida nela (tipo, como assim uma música com letra afiadíssima
criticando a ganância humana ser um dos carros-chefes de vendas do álbum?).
Destaque para o solo de sax executado por Dick Parry, que também já tocou com
Gilmour em carreira solo.
Chegamos à minha preferida do
álbum, em todos os sentidos: Us and Them. Aqui Dick Parry também dá o ar de sua
graça, tocando um saxofone melancólico no começo e ao longo da música. A letra
e o refrão me causam uma reação quase catártica, e a progressão entre ele e os
versos calmos é bem construída, sempre com backing vocals certos na hora certa.
Any Colour You Like é mais uma
(e a última) instrumental. Rick Wright e David Gilmour são as figurinhas
principais aqui, apoiados pela cozinha sempre eficiente de Rogério Águas e Nick
Mason. Mais um solo sensacional de Gilmour, que eu definiria como meio
“líquido” (não me perguntem onde arrumei esse adjetivo).
Enfim, as duas últimas músicas:
Brain Damage e Eclipse. Falo das duas de uma vez só por que elas são unidas,
assim como “Speak To Me/Breathe”. “Brain Damage” é talvez a mais triste e fala
sobre a loucura, acredito que muito dessa abordagem se refere à Syd Barrett
(que também ganhou referências em outros álbuns do Floyd). Ah, a risadinha do
lunático me dá um plus de tristeza, não sei por quê.
“Eclipse” vem logo em seguida e
eu gosto de compará-la a uma bomba prestes a explodir: começa perturbador e vai
crescendo até terminar explosivamente, seguido por sussurros e as mesmas
batidas do coração do começo, porém mais fracas, indicando o final.
Fiz esta resenha escutando o
próprio álbum, e a sensação que fica depois do último batimento cardíaco é a de
que estamos ouvindo pela primeira vez, um sentimento de redescoberta. Os sons
ficam ecoando na sua mente, como se você tivesse queimado um papel e estivesse
contemplando as cinzas. Ou como uma fênix: renasce das cinzas, e nunca é do
mesmo jeito de antes. Não são essas impressões que fazem os grandes clássicos?
Pra terminar, basta dizer que é
um álbum seminal, tão inovador que até hoje soa atual, e continuará
influenciando milhares de gerações, o contraponto perfeito entre sucesso
comercial e a arte pura. Se já ouviu, ouça de novo! Se não ouviu, tenha um
pouco de dignidade consigo mesmo e baixe, faça rolo com Zé do CD, enfim, dê um
jeito de escutar!
"There is no dark side of the moon really.
Matter of fact it's all dark."
Line up:
- David Gilmour - vocais, guitarra, sintetizadores e produção
- Nick Mason - bateria, percussão, efeitos e produção
- Richard Wright - teclados, vocais, sintetizadores e produção
- Roger Waters - baixo, vocais, sintetizadores, efeitos e produção
- Lesley Duncan - vocal de apoio
- Doris Troy - vocal de apoio
- Liza Strike - vocal de apoio
- Dick Parry - saxofone
- Barry St. John - vocal de apoio
- Clare Torry - vocal em "The Great Gig in the Sky"